INCÊNDIO:
Publicado hoje, 17/09/2024
O Parque Nacional da Serra dos Órgãos (Parnaso), na região serrana do Rio de Janeiro, é uma das diversas unidades de conservação do país que vem sofrendo com os incêndios florestais. As chamas atingem locais de difícil acesso, o que dificulta o combate.
Os esforços para debelar o fogo são conduzidos pelo Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro e por brigadistas do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA) que responde pela administração do parque.
De acordo com o biólogo Ernesto Viveiros de Castro, chefe do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, somente após o fim do incêndio é que a perícia entrará em campo para dar suporte às investigações. No entanto, ele é taxativo: "certamente alguém pôs fogo". Sua principal hipótese é de que as chamas tenham se alastrado a partir de áreas rurais vizinhas à unidade de conservação.
O ICMBio informa que combate 80 focos de incêndio em todo o estado do Rio de Janeiro. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) endossam as preocupações. No monitoramento por satélite realizado pelo órgão, foram registrados 978 focos em território fluminense desde janeiro. Já é o maior volume em um único ano desde 2014, quando houve 1.283 registros.
A situação é ainda pior em estados do Centro-Oeste e do Norte do país, como Mato Grosso, Amazonas e Pará. Diante do excesso de queimadas no Brasil o presidente Luiz Inácio Lula da Silva convocou uma reunião interministerial. A Polícia Federal está investigando se condutas criminosas estão envolvidas nas queimadas.
No Parque Nacional da Serra dos Órgãos, o incêndio atual atinge a área da travessia Cobiçado e Ventania. A unidade de conservação tem a maior rede de trilhas do Brasil. É também um dos locais mais buscados para a prática de esportes de montanha, como escalada, caminhada e rapel.Em entrevista à Agência Brasil nesta segunda-feira (16), Castro falou sobre a evolução do incêndio, as estratégias de combate às chamas, o histórico recente de queimadas na Serra dos Órgãos, a expectativa de recuperação das áreas afetadas, o funcionamento da unidade de conservação e as medidas que podem ajudar a evitar eventos semelhantes.
Ernesto Viveiros de Castro, chefe do Parque Nacional da Serra
dos Órgãos. Foto: Marcus Carmo/ICMBio
Agência Brasil: Qual as principais preocupações envolvendo
esse incêndio?
Ernesto Castro: Esse ano está bem seco. Devido aos efeitos do
El Niño, a gente já esperava uma ocorrência maior de incêndios nesse ano. Temos
tido incêndios com frequência, mas esse último é o pior do ano com certeza. E o
pior de alguns anos. O ponto de atenção é que está queimando uma área que não
costuma ser atingida. A gente não tem registro de queimadas nessa área. São as
florestas das encostas viradas para o mar, em Magé. Esse incêndio veio de
Petrópolis, da área do Caxambu que fica na vertente de dentro da serra. Mas
virou a serra e está descendo por área de floresta em direção à Magé.
Agência Brasil: Como tem se dado o trabalho de combate ao
fogo?
Ernesto Castro: É um fogo complicado de combater porque ele
está queimando o solo da floresta. Felizmente, a princípio não está queimando a
copa das árvores. Mas é uma área muito íngreme. E por essas características, só
conseguimos fazer o combate com aeronaves e montando trincheiras para frear a
expansão do fogo. Estamos lá hoje com 60 pessoas sendo 36 ligadas ao ICMBio e
24 bombeiros. De ontem para hoje, deu uma chuviscada em parte da vertente da
serra. Isso trouxe um pouco mais de umidade e melhorou um pouquinho com a
condição de combate.
Agência Brasil: Já é possível apontar as causas do incêndio
ou as principais hipóteses?
Ernesto Castro: Tanto a Polícia Federal como o ICMBio possuem
investigações abertas. A gente só consegue fazer a perícia depois de apagar o
fogo. Mas a origem mais provável são as áreas rurais vizinhas ao parque. E,
sendo assim, é uma prática criminosa porque não é permitido fazer queimada
nesse período. O que podemos dizer é que não existe registro de incêndio
natural nesta região. Não temos registro de raios há meses aqui. Então
certamente alguém pôs fogo. A questão é se foi intencional ou não.
Agência Brasil: Houve outros momentos críticos similares ou
piores nos últimos anos?
Ernesto Castro: Tivemos um incêndio bem grande em 2014, há
dez anos atrás. Foi pior do que esse, pelo menos até o momento. Na época, as
chamas subiram para os campos de altitude, na área mais alta da serra. É uma
área que tem muitas espécies endêmicas [espécies que ocorrem exclusivamente em
uma determinada localidade geográfica, não sendo encontradas naturalmente em
outros lugares]. Mas queimada de área de floresta no nível que estamos
observando agora não registramos há muitos anos. Normalmente, o que queima são
áreas mais abertas na vertente voltada para o continente, que é mais seca. A
umidade da floresta consegue abafar o fogo. Mas agora está propagando para a
floresta porque a região toda realmente está muito seca.
Agência Brasil: É possível estimar quanto tempo a vegetação
leva para se regenerar após esses cenários críticos?
Ernesto Castro: Isso só com uma avaliação após o incêndio.
Vai variar muito. Depende se o incêndio atingiu a copa das árvores, se queimou
o chão da floresta. Tem áreas de difícil recuperação na parte mais alta que foi
atingida, onde temos a travessia do Cobiçado e Ventania e o Caminho da Mata
Atlântica, que são trilhas do parque. Topo de montanha demora mais para se
recuperar. Mas ainda não fizemos uma avaliação detalhada porque o objetivo
agora é apagar o fogo.
Agência Brasil: Essas trilhas estão com acesso suspenso?
Ernesto Castro: Só estão fechadas as trilhas na área do fogo.
O parque não está fechado à visitação por enquanto. As decisões administrativas
dependem de avaliação, que é feita constantemente. A reabertura das trilhas vai
depender da propagação do fogo.
Agência Brasil: Na sua visão, o que pode ser feito para
impedir que eventos similares a esse voltem a ocorrer no futuro?
Ernesto Castro: O principal é a conscientização da sociedade.
De maneira nenhuma, as pessoas podem usar o fogo nesse momento de seca, seja
para queimar lixo, para limpar áreas agrícolas, para qualquer coisa. E em
outros períodos, só em condições muito específicas. Na parte de coerção, cabem
punições e penas mais rígidas. E precisamos fortalecer as estruturas de
investigação. Hoje, raramente alguém que coloca fogo na vegetação é realmente
responsabilizado.
Edição: Sabrina Craide
Com: Agência Brasil..
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